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domingo, 20 de novembro de 2011

Cada um tem o seu...

Deixem-me cá ver se me entendo com isto... Ah sim, já estou a conseguir. Esta tecnologia é tão estranha, mas por um lado sinto-me como se estivesse a ficar velha. Acho que é melhor aplicar uma máscara facial anti-rugas quando acabar de escrever isto. Bem, é melhor começar...


Sónia ainda não conseguiu esquecer a dor que a atormenta desde que Rui morreu, cada dia é pior que o outro, e um ano depois ainda está de luto. Percebeu agora que ama Rui como nunca amou ninguém. E agora a irmã Joana vem do Porto para a ajudar... e trás sabem quem? O namorado Alexandre... o Alexandre é simpático e até é boa pessoa, de vez em quando enerva-se e fica um bocadinho estranho... vai-se lá saber porquê. E o meu marido António trabalha numa imobiliária, a empresa onde trabalha é uma das melhores do ramo, somos casados à 30 anos e temos uma casa lindíssima. Esperem... eu disse casa? Não era isso que queria, dizer... temos é uma mansão. Ora, já nem sei o que estou para aqui a escrever. Desde que o meu filho, o Ricardo me disse para experimentar o seu computador enquanto ia ter com uns amigos, que estou para aqui entretida. Aquele rapaz saiu-me cá um reguila... mas não posso negar que isto é uma coisa toda XPTO, lá isso é. Há, e antes de nos despedirmos falta apresentar alguém! Eu... eu sou a Rosália... muito prazer.


Está feito! Bom, para a primeira vez até que não correu nada mal. - Disse Rosália sorridente, e satisfeita ao mesmo tempo. Ricardo entrou então no quarto, viu a mãe sentada na secretária a escrever no computador.


-Boa tarde mãe.

-Boa tarde querido. Já sabe as últimas, aqui a sua mãe conseguiu escrever um pequeno texto aqui no computador. Foi bastante fácil, não estava à espera que conseguisse.

-Criar um texto? Está a gozar comigo? Isso é a coisa mais básica que se pode aprender a fazer num computador, mas também não admira...

-Ei, ei, ei! Nem tente acabar a frase. Já sei que o menino ia dizer que eu sou desactualizada e que não gosto nada destas coisas. Posso admitir que era verdade, antes de escrever este belíssimo texto, com a ajuda do simpático corrector ortográfico. Olhe, acabei de ter uma excelente ideia. Que tal ajudar-me a criar um Facebook? Hoje em dia está bastante na moda, e o menino sabe que a sua mãe gosta de andar sempre na moda não é?

-Pois mãe, mas agora não dá. Tenho trabalhos para fazer. Fica para outra altura. - Respondeu o rapaz.

-Claro, querido. Não o quero incomodar, quanto mais os seus estudos. Vou andando para a sala! Ah, e não se esqueça que hoje vamos jantar fora com o seu pai. Por isso, mandei a empregada arranjar a sua roupa. Não se atrase. - Disse Rosália

Rosália dirigiu-se para a sala já com a mascara facial aplicada, sentou-se no sofá e acendeu a televisão.

(Televisão) - "Hoje no Jornal das 8, vamos revelar imagens inéditas da noite em que José Gomes assassinou 3 jovens em vingança ao filho. O caso já dura à mais de um ano, e as dores ainda são visíveis naqueles que lhes eram mais próximos. Vamos também estar no tribunal onde José Gomes fez a sua primeira audiência, esta tarde. Como hoje é Domingo, Marcelo Rebelo de Sousa vai estar aqui no Jornal das 8, para comentar o apelidado "Caso Parque" e mostrar a sua opinião sobre a demorada justiça em Portugal".

-Meu deus, só mesmo este pais. Um ano depois ainda nem sequer prenderam o homem. Que horror! - Disse Rosália.

- Ora boa tarde. Está alguém em casa? - Perguntou António, ao mesmo tempo que fechava a porta de casa.

- Estou aqui querido. - Respondeu Rosália levantando-se do sofá.

-Ah... meu deus mulher. Quer matar-me do coração aqui no meio da sala? - Perguntou o homem ainda em sobressalto.

-Calma querido, é apenas uma máscara facial anti-rugas. Não era preciso assustar-se. - Respondeu.

-Mas para que é isso tudo, explique-me lá?

-Sabe querido, é uma longa história. Passemos à frente... é melhor ir arranjar-se para o jantar, se não chegamos atrasados. - Disse Rosália.

Sónia estava na sentada num banco, à espera da camioneta. A sua irmã tinha vindo do Porto para lhe dar apoio nesta fase difícil. Já há um ano que o pesadelo acontecera, mesmo assim as imagens não se apagavam, elas continuavam lá, vivas, como se tivesse sido ontem. O autocarro parou, e abriram-se as portas, uma onda de gente saiu, até que Joana apareceu. As duas abraçaram-se de imediato.

-Maninha... que bom ver-te. - Disse Joana. - Estava cheia de saudades tuas.

-Eu também... - Respondeu Sónia. - O Alexandre não veio? Perguntou de seguida.

-Veio, veio, ele foi só buscar as malas. - Até que Alexandre aparece.

-Olha vês? Fala-se no diabo... - Disse ao mesmo tempo que soltava um sorriso. - Sónia este é o Alexandre, Alexandre esta é a minha irmã Sónia.

-Muito prazer. - Disse o rapaz.

-Vamos? - Perguntou Sónia.

-Sim, vamos. - Respondeu Joana. - Logo vamos jantar fora certo? Já não venho a Lisboa à muito tempo, e está me a apetecer passear um pouco pela cidade. - Perguntou Joana.

Rapidamente escureceu, Sónia a irmã e o namorado já estavam preparados para sair.

-Bem, vamos nos divertir não vamos? - Perguntou Joana.

-Claro. . Responde a irmã angustiada.

-Não tem sido nada fácil pois não? - Perguntou.

-Não, nada mesmo. - Respondeu

-Mas vais ver, tudo vai passar, em breve esquecerás essa dor dentro de ti.

-Só espero que sim.

-Também tenho muita pena que eles tenham morrido. Mas o que importa agora é que o culpado está a cumprir por tudo o que fez, a eles e toda a gente.

Sónia permanece calada ouvindo os conselhos da irmã mais velha.

Finalmente chegaram ao restaurante, o restaurante tinha sido indicado por Sónia, era ali que ia muitas das vezes que saia com os amigos.

Sentaram-se todos na mesa à espera das entradas. Sónia olhava para a televisão com atenção, ela não sabia mas talvez procurasse uma noticia sobre o caso do parque, mas tal não aconteceu porque o “Jornal das 8” foi para intervalo.



-Mãe... Oh mãe... - Gritava Ricardo do quarto. - Estamos atrasados.

-Já vou querido, estou só acabar de me arranjar. - Respondeu.

António já estava no carro á espera, quando a espera já era muita começou a buzinar.

- Ai homem já vou. Gritava Rosália fechando a porta de casa apressadamente.

-Bem é que já estamos atrasados e temos a mesa reservada no restaurante. Respondeu o marido.

-Mais um bocado chegamos lá e invés de jantarmos ajudamos os empregados a lavar o chão. Brincou Ricardo.



No restaurante, Sónia, Joana e Alexandre acabavam o prato principal, quando Sónia olha novamente para a televisão. Tinha começado agora a segunda parte do “Jornal das 8”:

- “Boa noite já à novas informações sobre o caso “Parque” que foram divulgadas pelo agente da PJ João Mendes o agente afirma que pode não haver provas suficientes contra o arguido e que este pode sair em liberdade”.

Sónia que estava com os olhos postos na televisão entra em estado de choque, o assassino pode sair em liberdade? Quer dizer que a sua própria vida pode estar em perigo, e nada acabou quando o parque se fechou.

-É melhor levá-la lá para fora. - Disse Alexandre.

-Pois, acho que tens razão, assim até apanha um pouco de ar. - Esperas aqui que eu já volto? Interrogou Joana.

-Sim, vai lá eu fico aqui e vou pagar a conta. - Respondeu o rapaz.

António, mal estacionara o carro, viu sair Sónia e a irmã.

-Eu já vou lá ter com vocês! Podem ir andando. lembrei-me agora que tenho de fazer um telefona para a imobiliária. - Disse o homem.

-Está bem querido, mas não se demore.

Na mesma altura em que saia Sónia e a sua irmã entravam Rosália e o filho. Rosália conforme andava ia olhando para trás com um ar de intriga de que algo ali se passava mal, já Ricardo pressentira que conhecera a rapariga de qualquer lado. Sentaram-se pegaram na ementa e começaram a escolher o que queriam para jantar. Alexandre olhava para Ricardo fixamente. Lá fora, Sónia ainda chorava no ombro da irmã, lembrando-se dos momentos horríveis que tivera passado, de nunca mais poder ver os seus amigos e a pessoa que mais amava no mundo. Para Sónia a palavra ‘Nunca’ já a fazia chorar. Estavam ali as duas à porta do restaurante, sentadas no chão e encostadas á parede, Joana não sabia o que haveria de fazer.

-Vou lá dentro buscar água, fica aqui. - Disse Joana para a irmã. - Enquanto isto, António observava ao longe. Queria ir ter com Sónia, mas não podia. Não queria ter que enfrentar o olhar de Rosália... nem que Ricardo desconfiasse de algo.

Pouco depois da irmã ter entrado no restaurante Sónia vira passar um rapaz do outro lado da rua, muito parecido com Rui. Atravessou a estrada a correr para ter a certeza, um carro que estava a passar fez uma travagem brusca, Sónia corria no meio da estrada fazendo com que todos os carros parassem.

-Você é maluca da cabeça ou quê? - Gritou um dos condutores.

Mal Sónia chegara ao outro lado da rua gritou:

-Rui.

Joana que estava dentro do restaurante tinha ouvido um monte de buzinões, e foi à porta ver o que se passava. Quando viu a irmã a fazer aquele disparate correu para junto da dela, agarrou-a pelo braço e puxou-a para perto de si, o rapaz começara a fugir do susto.

-Não, Rui, não… - Gritava a rapariga desesperada.

-Sónia, está quieta. - Dizia a irmã agarrando-a pelo braço com força.

-Estás maluca Sónia, viste o que acabaste de fazer? - Exclamou Joana.

-Maluca? Maluca eu? Eu não estou maluca, era o Rui eu tenho a certeza, era ele! Eu tenho a certeza! - Respondeu a irmã lavada em lágrimas.



Novamente no restaurante, Ricardo estava a caminho da casa de banho quando vê Alexandre a ir atrás dele. Lá dentro Alexandre agarra-o pelos colarinhos ameaçando-o:

-Olha, meu cabrão de merda se não pagares aquilo que deves vai ter que te haver comigo ouviste? Tu e os teus paizinhos! - Gritou Alexandre.

-Eu vou pagar juro! Só tenho de esperar mais uns dias, só mais uns dias e dou-te a massa toda! Prometo! - Respondeu Ricardo.

-Esperar mais uns dias? Farto de esperar estou eu, e a merda do dinheiro nunca mais vem! Olha puto, é a tua última oportunidade, ou pagas ou morres! - Gritava Alexandre largando os colarinhos de Ricardo quando vê o chefe do restaurante a entrar na casa de banho.

-Há confusão? - Perguntou o homem.

-Não, só estamos aqui a conversar não é? - Pergunta Alexandre virando-se para Ricardo.

-É, é, só estamos aqui a falar de uma coisa, nada importante. - Responde o rapaz caminhando para a saída.



Joana e a irmã ainda discutiam no meio da rua...

-Tu não percebes pois não, eu tenho certeza que era o Rui. - Disse Sónia.

-Sónia, vê se percebes isto de uma vez por todas, o Rui está morto! Está morto, não há nada que se possa fazer. Está morto!

-Chega, não consigo mais ouvir os teus disparates. Eu tenho a certeza que era ele, tenho a certeza. - Respondeu Sónia. Abraçou a irmã e começou a chorar como nunca o antes tinha feito enquanto dizia:

-Era ele... eu tenho a certeza.

Pouco tempo depois ali abraçadas no meio da rua, Joana e Alexandre juntamente com Sónia decidiram voltar para casa. Mal chegou, Sónia dirigiu-se ao quarto sem dizer uma única palavra se não:

-Vou dormir, até amanhã!

Sentados no sofá da sala, Joana e Alexandre falavam dos problemas que Sónia estava a enfrentar.

-A tua irmã está mesmo mal. Aquilo afectou-lhe muito. - Disse Alexandre.

-Pois, é, foi uma verdadeira reviravolta na vida dela. Mas agora não à nada a fazer, não dá para voltar atrás. Foi obra do destino.

Sónia que se tinha levantado da cama para ir buscar um copo d’água estava a ouvir toda a conversa.

-Acho que a devias levar a um psicólogo, talvez a ajudasse.

Sónia que entretanto ouvia a conversa, assustada deixou cair o copo no chão, e foi a correr para o quarto.

-O que é que foi isto? - Perguntou Alexandre inquieto com o susto.

-O barulho veio da cozinha. - Respondeu Joana

Joana dirigindo-se à cozinha vê o copo caído no chão e abana a cabeça para os lados olhando para o namorado.

-É melhor eu ir falar com ela. Apanhas os vidros por favor?

-Sim, claro vai lá falar com ela. Deixa isto aqui comigo. - Respondeu.



Joana entra no quarto de Sónia e pergunta:

-Então maninha o que aconteceu? - Perguntou com uma cara muito preocupada

-Nada! Sai daqui! - Respondeu Sónia à irmã.

-Ok, volto quando estiveres mais calma. - Disse Joana

-Não! Sai daqui, sai da minha vida, sai da minha casa. Sai! Poe-te na rua, tu e aquele gajo. Saiam! Saiam por favor. - Gritava Sónia desesperada encaminhando a irmã para a saída do quarto.

Sairam as duas do quarto indo para a sala...

-Saiam os dois daqui. Já! Saiam!

Alexandre incrédulo com a situação tenta acalmar Sónia.

-Calma Sónia. É melhor ires deitar-te e amanhã falamos todos melhor. Afinal já é tarde e...

-E? E o quê hã? Tu aqui não mandas nada pá! Se eu quiser dormir durmo, se não quiser não durmo. Se quiser estar calma estou! Se quiser me chatear com esta gaja é na boa.

-Sónia, vai te deitar é melhor. - Diz Joana agarrando na irmã pelos braços.

-Larga-me já! Larga-me, larga-me já! - Gritava Sónia desesperada atirando a irmã para o chão.

-Saiam daqui! Saiam daqui os dois já disse. Saiam! Fora daqui! Saiam! Saiam de uma vez por todas! - Gritava Sónia dirigindo-se para o quarto e fechando a porta furiosamente.



Alexandre ajuda Joana a levantar-se no chão e pergunta:

-Estás bem amor? - Perguntou preocupado.

-Sim, estou bem não te preocupes. Vamos dormir que já é um pouco tarde.



Durante a noite Sónia arrumava as suas coisas dentro de uma mochila. Decidida a ir embora daquela casa o mais rápido possível. Estaria novamente Sónia a seguir o caminho certo para o Destino?